Revista Casa Marx

Trumpismo, guerra e diplomacia capitalista verde: os limites da COP30 num mundo em crise

Rosa Linh

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Geopolítica, política ambiental e as tensões entre EUA e China

É simbólico que pela primeira vez a Conferência das Partes (COP) seja sediada na Amazônia, e também o é que ela ocorra na segunda presidência de Donald Trump nos Estados Unidos, que como Juan Chingo escreveu recentemente, está transformando o principal hegemon imperialista mundial em uma potência revisionista da ordem neoliberal que ele mesmo promoveu durante décadas. Diante dos limites de sua hegemonia, a política de Trump articula-se no reconhecimento do declínio relativo estadunidense e se destina a preparar melhor estrategicamente para futuros embates mais contundentes com a China, inclusive militarmente. O Império precisa ganhar tempo para se reconstruir em termos de indústria, forças armadas e economia, todavia suas ações geopolíticas aceleram conflitos, minando aliados, freando investimentos e acelerando a transição para uma ordem multipolar. A radical revisão da ordem neoliberal, apoiada na guerra comercial com o gigante asiático como vimos no começo do ano, visa remodelar a ordem global a partir das fortalezas norte-americanas na arena internacional, relegando o soft power à pura nostalgia e administrando as relações bilaterais para se extrair o máximo possível em benefício próprio. Agora, diante da ofensiva reacionária de Israel contra o Irã, a ameaça dos EUA entrar diretamente em uma guerra total no Oriente Médio se vê cada vez mais concreta, mostrando como o suposto “pacifismo”, mais isolacionista e nacionalista do “America first”, está intimamente ligado com essa necessidade de revisão da ordem neoliberal, multilateral e “democrática”. 

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Para sustentar essa agressividade, há uma necessidade imperiosa de aquisição de matérias-primas, soberania tecnológica e subordinação de aliados. É nessas coordenadas que se insere o salto de qualidade na exploração fóssil e extrativista de Trump: há uma necessidade de territórios que forneça aos EUA mais energia, minerais e alimentos, ao passo que precisam proteger sua indústria da concorrência chinesa e buscam que seus aliados, como México e Europa, comprem e invistam “americano”. Não por acaso, os EUA se retirou do Acordo de Paris, sendo que é o país que mais emitiu gases de efeito estufa na série histórica e é o segundo na atualidade atrás apenas da China, evocando sua política radical de “drill baby drill”, passando por uma onda de desregulamentação na legislação ambiental, processando Estados por ações judiciais contra empresas de combustíveis fósseis e avançando na exploração das reservas de petróleo e gás no país, com intensivo uso do fracking. Para sustentar o “Make America Great Again”, Trump parte do terreno aberto pelo capitalismo verde do Partido Democrata e suas medidas cosméticas que iam desde offshores de crédito de carbono às metas de redução das emissões (que na prática são mera fachada), enquanto atacava povos originários no Alasca, favorecia os capitalistas fabricantes de carros elétricos como Elon Musk e sua cruzada extrativista golpista no triângulo do lítio sul-americano, e era o primeiro contra as greves de metalúrgicos das grandes montadoras de veículos automotores –  no qual o próprio movimento ambiental saiu em defesa, dizendo que não haveria justiça climática sem empregos e salários decentes para a classe operária. Não por acaso, foi só assumir Trump que mais de 70 das medidas de Biden para o meio ambiente foram revogadas nos primeiros dias de governo do republicano

Por outro lado, ainda que esteja passando por uma crise econômica, com taxas relevantes de desemprego, a China respondeu à altura as taxas comerciais de Trump, mostrando-se inclusive menos disposta a acordos do que em 2018. Tendo arrefecido esse primeiro momento de guerra comercial, o caminho para um “armistício” parece tortuoso e incerto. No que tange a agenda ambiental, há tendências de que a China se aproveite da retirada dos EUA do Acordo de Paris para assumir maior protagonismo no nicho de mercado da assim chamada “economia verde”, como os carros elétricos e energia renovável, o que não contradiz a manutenção de sua matriz energética fóssil largamente baseada no carvão. Ainda que o país tenha reduzido o uso do carvão para energia em cerca de 55% (o que ainda assim corresponde a 52% do uso global, sendo o país responsável por 30% das emissões mundiais), o próprio uso desse combustível fóssil atingiu recorde histórico bruto em 2024, fora que a demanda por seu uso permanece altíssima na China, Indonésia e Índia. Xi Jiping já está implementando a construção de novas mega-usinas de carvão. Isso é uma mostra do que Leandro Lanfredi, diretor do Sindicato de Petroleiros do Rio de Janeiro Sindipetro-RJ) disse na mesa “Catástrofe climática e a urgência de uma resposta ecológica comunista”, de que os capitalistas tomam as fontes de energia não necessariamente pelo o que é mais eficiente do ponto de vista energético, mas pelo o que pode gerar de retorno no acúmulo de capital, remetendo à tese do marxista sueco Andreas Malm e a constituição do capital fóssil em detrimento de outras matrizes energéticas. Importante dizer também como a própria dinâmica chinesa de aumento da exportação de capitais para países da periferia do sistema, como na África, América Latina e Ásia, demonstradas na possibilidade de expansão da fronteira agrícola com mais trocas comerciais com o agronegócio brasileiro ou mesmo na corrida pelo lítio, trazem consequências nefastas na precarização do trabalho e na degradação natural apesar do discurso “sustentável”. 

Em novembro do ano passado, o secretário executivo das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas, Simon Stiell, afirmou que a China deve liderar os esforços globais contra o aquecimento global, e não podemos descartar que o gigante asiático tenha mais “soft power” nesse âmbito, o que certamente também fará o Brasil neste ano em que preside o BRICS, inclusive. Ademais, as últimas metas climáticas chinesas, que já são bastante “para inglês ver”, nem sequer foram cumpridas, o que corrobora com a ideia de que a grande questão para a China atualmente nesse terreno é aproveitar os nichos de mercado abertos, seja em energia renovável, seja em fóssil, ao passo que tenta costurar alianças comerciais a seu próprio benefício, preparando-se para enfrentamento mais robustos contra os EUA. 

O multilateralismo capitalista capitaneado pelos chineses não pode e não tem interesse em encarar uma transição energética seriamente, a não ser em discursos vazios de que os recursos para seu financiamento viriam da exploração de mais matrizes fósseis. Na realidade, a postura de Trump moldou o cenário internacional de forma mais favorável a medidas de desregulamentação climática, como se pode ver com a União Europeia aprovando a flexibilização das normas de sustentabilidade das empresas. Na esteira do caminho aberto pelos Democratas e já vislumbrando a presidência de Trump, grandes bancos imperialistas como JPMorgan Chase, Citigroup e Bank of America, como afirma o Financial Times, aumentaram o financiamento dos combustíveis fósseis em mais de um quinto em 2024, numa grande inversão da tendência dos últimos anos. O financiamento do carvão, petróleo e gás fornecido pelos 65 maiores bancos do mundo através de ativos aumentou em 162 bilhões de dólares, para 869 bilhões de dólares, de acordo com o 16.º relatório produzido por uma coligação de grupos coordenados pela Rainforest Action Network, com base em dados de empréstimos e subscrições de mais de 2.800 empresas. Isto marcou a primeira vez que o valor total do financiamento de combustíveis fósseis não diminuiu desde 2021, ano em que muitos bancos anunciaram o seu apoio às metas líquidas zero na cimeira climática COP26 da ONU, em Glasgow. 

Toda a dinâmica de exploração de petróleo na foz do Amazonas no Brasil, projeto iniciado no governo Bolsonaro e levado agora a cabo por Lula em um franco ataque aos servidores do IBAMA, está circunscrito nessa lógica, com a presidente da Petrobrás, Magda Chambriard, não tendo vergonha de repetir a frase de efeito trumpista “drill baby drill” na Offshore Technology Conference. Após  o recente leilão da Agência Nacional de Petróleo, vendendo 34 blocos de petróleo, dentre eles 19 na Foz do Amazonas, além de Parecis, cujos impactos nas comunidades indígenas serão consideráveis para dizer o mínimo, para multinacionais como a Exxon Mobil, Chevron e a chinesa CNPC, é escandaloso. A área leiloada corresponde ao tamanho de RJ e ES juntos, o que só foi garantido com o governo Lula enviando a Tropa de Choque para barrar o protesto de petroleiros, povos originários e organizações socioambientais na sede da ANP, na qual a juventude Faísca Revolucionária e o Nosso Classe Petroleiros esteve presente. O PL 2632/25, promulgado por Lula em regime de urgência, contou com ajuda do centrão para acelerar a entrega dos bens naturais nacionais, cujos recursos arrecadados – R$ 35 bilhões – irão para manter o “equilíbrio” do Arcabouço Fiscal neoliberal e pagar os juros da dívida pública para os bancos imperialistas – os mesmos que financiam a barbárie climática. Não por acaso, o desmatamento na Amazônia em maio bateu o 2º maior nível para o mês de maio, contabilizando 128 mil campos de futebol. O compromisso de Lula é categórico, e não é com o meio ambiente.

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As contradições entre diplomacia verde e a situação atual da crise ecológica 

Se já estamos vendo uma mudança de qualidade significativa na diplomacia e na política internacional a partir de Trump, será que também não estamos no prenúncio de um salto de qualidade na própria crise climática? Além disso, será que também não nos avizinha uma crise mais profunda da diplomacia verde e do multilateralismo ecológico? Há alguns fatores que jogam a favor dessa tendência e outros a contradizem. E isso é chave para pensar os ritmos nos quais o movimento ambiental pode ganhar contornos mais concretos de luta independente e radical. 

Sobre a situação objetiva da crise ecológica. Segundo estudo publicado pela Nature Climate Change, entre 1990 e 2020 houve um aumento de 0.61º C na temperatura terrestre, um nível recorde que corresponde também com a expansão das cadeias de valor globais com o neoliberalismo. Outro dado que está sendo bem utilizado é o de que 65% dessas emissões é de responsabilidade dos “10% mais ricos” da população, o que inclusive esconde de certa forma o caráter de classe do aquecimento global ao dissolver as emissões por estratificações de renda, abstraindo justamente a dinâmica metabólica da acumulação de capital e quem são os detentores dos meios de produção e com qual finalidade estes são administrados. Ademais, o fato é que pela primeira vez a temperatura média global ultrapassou o nível de 1,5ºC com relação à era pré-Revolução Industrial, sendo que 55,45% desse aumento se concentrou apenas nos últimos 30 anos. O valor é de aproximadamente 1,55 ± 0,13 °C acima do período de referência de 1850-1900. No entanto, o aquecimento global médio a longo prazo ainda está abaixo de 1,5ºC, o nível estabelecido pelo Acordo de Paris como limite para as políticas ambientais, situando-se entre 1,34 e 1,41ºC, com influências aqui também do El Ñino. O aquecimento dos oceanos e a elevação do nível do mar já se encontram em ponto de não retorno, bem como é o caso da extinção de uma série de espécies. 

Podemos ver essas consequências nos incêndios florestais brutais que devastaram a Califórnia, ou mesmo as recentes inundações em Bahia Blanca na Argentina, em Valência na Espanha, para não falarmos das ondas de calor no Brasil – e agora mais recentemente a retomada da situação de calamidade pública por conta das chuvas torrenciais no Rio Grande do Sul que já deixaram, até o momento da escrita desse artigo, mais de 6 mil pessoas desabrigadas e três mortos. É preciso ter em mente também como essa estipulação de cenários está primeiramente pensada para a acumulação de capitais da burguesia internacional, dirimindo as consequências já nefastas que atingem milhões de pessoas, em particular as mulheres, negras, povos originários e comunidades tradicionais pelo mundo com eventos extremos no clima e na retroalimentação da desestabilização dos ciclos biogeoquímicos (principalmente os da água e carbono, mas também do fósforo e nitrogênio). Além disso, os últimos anos já demonstraram como o aquecimento global está interferindo na acumulação de capital, o que impacta diferentemente os diversos setores da burguesia, refletindo-se nos preços como na alta do café e outros gêneros alimentícios. Ao mesmo tempo, usa-se do aquecimento global para fazer uma “limpeza de capitais” como no caso brasileiro do “dia do fogo 2.0” no ano passado. Em suma, o cenário geopolítico e econômico é de aceleração das contradições da ruptura sócio-metabólica da biosfera terrestre, e isso cada vez mais trará questões candentes que afetam a própria forma como o socio-metabolismo do capital opera e, portanto, tende a atingir com mais força os bastiões operários. 

É nesse panorama que ocorre a COP30. A contradição candente pode ser explicitada na fala da CEO da COP30, Ana Toni, afirmando que a saída dos yankees do Acordo de Paris abre uma janela de oportunidades para empresas privadas e governos de outros países, entre eles o próprio Brasil, para que ocupem lugares mais destacados na política internacional de descarbonização. Isso, claro, partindo da defesa e da necessidade de restabelecimento de um multilateralismo e uma diplomacia verde com compromissos mais fortes para frear uma “onda” de desregulamentação, afrouxamento de prazos e desfinanciamento climático. A questão dos fundos de investimento para o clima é crucial para o sucesso diplomático da COP30, o que ameaça essa nova edição ser um fracasso ainda mais retumbante do que a última, marcada pelo lobby fóssil, compromisso pífios e que cada vez convencem menos a juventude e a classe trabalhadora mundial. Para além dos impactos de desfinanciamento que podem vir a atingir setores importantes das ciências climáticas, a questão financeira das COPs é uma verdadeira barganha monetária entre os países, e o uso dessas remessas fica ao critério arbitrário das nações usarem como bem entenderem, desde investimento em offshores de mercado de carbono, até parcerias bilionárias com empresas privadas  – a mais pura anarquia do mercado. Considerando a evasão dos EUA também das medidas de financiamento, e a discussão da reversão desses montantes para o rearmamento das potências como na Europa, não podemos deixar de considerar que tudo isso torne o evento esvaziado, sem a presença de líderes de países centrais, inclusive o próprio Xi Jinping. Em suma, seja pela variante trumpista de radicalizar a crise ambiental pelo “Make America Great Again”, seja pela via chinesa de “capitalismo verde multilateral” de se aproveitar dos nichos de acumulação abertos, está colocada a possibilidade de um salto de qualidade na crise ambiental para os próximos períodos. 

Para onde vai o movimento ambiental?

O que dará cabo à uma síntese dessa contradição, entre capital e natureza, na realidade, é a superação dialética entre um movimento ambiental que atua quase exclusivamente como mera resistência à crise e não enquanto promotor de uma estratégia positiva para passar à ofensiva, e a necessidade de que as novas gerações ambientalistas, que tomam a bandeira palestina como sua e cada vez mais ligam a causa ecológica com a da luta dos trabalhadores, superem a lógica por setores da esquerda e do neorreformismo que se preocupa mais em pressionar instâncias imperialistas falidas como a COP e a ONU, a mesma organização responsável pela instituição criminosa da partilha da Palestina e criação do Estado sionista de Israel em 1947, ao passo que se subordinam às estratégias de lobby e da institucionalidade burguesa. Esse é o debate que fazemos, por exemplo, com o PSOL no Brasil, que além de compor um governo burguês comprometido até a medula com a destruição ambiental, fala em “ecossocialismo” enquanto joga todas as fichas para “pressionar criticamente a COP30”, como faz o MES e sua juventude Juntos!, ao lançar a plataforma “Universidades contra o fim do mundo”. Na mesma lógica, Michel Löwy, ligado ao Secretariado Unificado mandelista, advoga por uma lógica muito próxima daquelas dos mercados de carbono para sanar a questão da Foz do Amazonas, na medida em que as potências imperialistas deveriam indenizar o Brasil para que este financie sua transição energética, não muito diferente também do Green New Deal proposto pelo DSA norte-americano, no qual os Estados burgueses dariam bilhões de dólares para as empresas poluidoras “deixarem de ser poluidoras”. É esse tipo de posição que mantém o movimento ambiental à reboque do mal menor burguês de turno, adapta-se aos governos ditos “progressistas” em nome de frear a extrema-direita, no entanto lhe abrem espaço e não fazem mais do que “adiar o fim do mundo”. O extremo oposto seria estratégias anarquistas e autonomistas de ação direta, baseadas muitas vezes em ações de terrorismo ecológico com o objetivo de chamar o máximo de atenção possível para desencadear revoltas em prol do clima, abstraindo completamente a necessidade da organização em partido revolucionário, da preparação teórica e estratégica, da luta contra as burocracias sindicais e da unidade com a classe trabalhadora – mesmo a de setores poluentes. 

Por outro lado, ao contrário dos catastrofistas, todavia, que vem o fim do mundo na próxima esquina, ainda não estamos em uma situação de não retorno irreparável em toda linha, o que não diminui a urgência de nossa tarefa. Essa constatação é importante para nos diferenciarmos de certos setores da esquerda, como a abordagem trazida por Renato Cinco do Contrapoder no debate organizado pelo Instituto Casa Marx citado acima, na medida em que defenda corretamente a impossibilidade de uma transição energética se dar dentro dos limites do Estado burguês, delimitando-se de todo esse arco do dito “ecossocialismo”, apontando a necessidade da revolução socialista e um programa transicional que abarque a questão ecológica de maneira radical, todavia trata a crise ecológica como um “colapso ambiental”, algo que para além de mera terminologia, diz respeito aos ritmos da presente crise e qual a resposta que precisamos dar. Se estivéssemos em um colapso no sentido estrito do termo, ou em sua iminência imediata, isso iria despender energias e foco militante para atuar como se estivéssemos num cenário de devastação comparados à de uma guerra civil, o que inclusive não está descartado para o futuro caso a crise ambiental não seja rapidamente resolvida de forma radical. É preciso ver a crise ambiental em seu todo dialético, em suas tendências e contratendências, cujos saltos de qualidade precisam ser compreendidos em seu movimento real. Além disso, a sinalização de Paul Burkett é pertinente aqui: “para ser franco, o capital pode, em princípio continuar a se acumular sob quaisquer condições naturais, por mais degradadas que sejam, enquanto não houver extinção completa da vida humana”, isto é, o “colapso ambiental” não significaria o fim do capitalismo, como poderiam sugerir alguns setores do aceleracionismo, mas daria lugar num primeiro momento a formas ainda mais degradadas de barbárie e escravização da valorização do valor e da supremacia do trabalho abstrato contra a natureza e o trabalho vivo que iriam se suceder ao longo do tempo. Devemos acrescentar que, antes de um “cenário vênus”, isto é, da extinção massiva na Terra, há um mundo em uma renovada etapa em que se inscrevem crises e crashs econômicos, de guerras interestatais regionais ou mesmo mundiais, mas também a possibilidade de revoluções triunfantes – o que necessariamente perpassa as condições materiais do metabolismo socio-natural também como fator dialético tanto como catalisador, quanto inibidor desses fatores. John Bellamy Foster coloca como a atual situação da crise ambiental coloca a possibilidade de emergência de um “proletariado ambiental” diante da crise capitalista, isto é, pela posição na produção do proletariado diante do metabolismo entre sociedade humana e natureza, é esse setor social que mais sente as suas consequências e também o que pode dar uma solução final com o restabelecimento do metabolismo numa sociedade de produtores livremente associados. Foster não vai até o final em sua elaboração, acaba caindo em uma ode à governos bonapartistas de esquerda como o de Chávez ou de Evo Morales, recaindo numa visão moral – da qual ele mesmo critica a princípio –  sobre a posição do proletariado diante da crise ambiental apenas como “o setor que mais a sente”, abstraindo de onde pode germinar essa nova sociedade de “produtores livremente associados”: da auto-organização em cada local de trabalho e estudo, retomando a lógica da constituição de frações revolucionárias nos bastiões da produção operária, que em uma época de cadeias de valor globalmente entrelaçadas, pode subverter com a planificação democrática da produção o cálculo frio e anárquico da valorização do valor e do trabalho abstrato e, sob uma mudança radical da forma como se produz e reproduz a vida, batalhar com um sentido íntimo de auge cultural, como dizia Trotsky, por uma vida ecológica e humanamente abundante.  

Nesse sentido, no que se refere a um possível salto de qualidade na crise da diplomacia verde e uma irrupção de um movimento ambiental superior e independente, o que joga a favor é a gravidade da crise climática, o avanço da extrema-direita a nível mundial, a “fragilidade moral” da qual padece a COP30, o impacto que a crise ambiental pode ter na produção e reprodução da vida em um momento de ressurgimento relativo do movimento operário, em vias de haver mais possibilidades de fusão entre juventude e classe trabalhadora. O que joga contra é a política de governos como da China e Brasil para financiar o multilateralismo e suas alternativas de mal menor, a políticas de parte da esquerda que alenta o ceticismo e é a quinta roda dos “governos capitalistas progressistas de turno”, além da continuada separação gerada pelas burocracias sindicais do político com o econômico. Trata-se, portanto, de construir um movimento ambiental independente dos governos e dos capitalistas, pró-operário, revolucionário e comunista, um ambientalismo de hegemonia operária que paute a necessidade de uma transição energética sob gestão operária e controle popular, algo que só pode ser conquistado com um governo de trabalhadores em ruptura com o capitalismo. Para isso, é necessário um movimento ambiental que restabeleça a cientificidade da análise materialista dialética para compreender onde estamos e vislumbrar as batalhas que se avizinham, e a partir disso que atue para recuperar as entidades estudantis e os sindicatos operários para as mãos dos estudantes e trabalhadores em aliança com os povos originários, cientistas e trabalhadores rurais, batalhando contra as burocracias que dividem e separam esses setores. Um bom prenúncio é a radicalização de ambientalistas como Greta Thunberg, unindo as bandeiras contra o genocídio em Gaza ao da causa ambiental, mostrando como as novas gerações, em especial a juventude trabalhadora, sacudir o conjunto da classe trabalhadora e reconstituir um imaginário socialista ecológico em nosso tempo.   

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